14 junho 2017

Suspensão

As filas cansam-me especialmente.
Há um peixe prateado que nada na minha cabeça.
Penso nas filas e nas pessoas das filas que aguardam um lugar para uma pessoa.
O potencial cancerígeno que há nas filas e no ato de comer
- acima de dormir, acordar ou gozar – sozinho.
Sobretudo esperar sozinho na fila para comer sozinho.
O peixe para.
Dormiu...
Não quero pensar nas filas
E no câncer.
Penso na hora dos peixes:
Dormem? Quando dormem? Porque dormem se, lá embaixo, descansam eternamente do furduncio do mundo?
Passo a pensar em atividades terroristas
Na má distribuição de aquecimentos básicos –
Deveríamos ter as horas de sono dos peixes
Ou o silêncio
Dos peixes
Ou ainda, nem que fosse, sua textura
             (centenas de vidas dedicadas
               á captura dos reflexos lunares)
O peixe parado dorme. Sonha a arquitetura pós-moderna dos corais.
Se estivesse posto ao mar, talvez não dormisse, mas porque está em minha cabeça dorme.
Também eu dormia
fosse um peixe em minha cabeça.
Tomemos que nada no mar e que se atira
mas não despenca
porque debaixo do mar onde nada
há também mar.
Tomemos que não está sob a ditadura da minha insanidade.  
Jamais dormirá.
Será peixe enquanto inventamos o calendário astrológico dos signos para explicar a necessidade anímica de dormir e ser peixe.
Será peixe descansado e distraído ainda que inventemos uma aba muito pequena do Oceano Índico onde poderá legalmente transitar na condição de peixe.
E nos aqui em cima inventaremos que é preciso lavar a nuca e os pulsos antes do sono –  a regra única que nos fará peixes de madrugada.
Mas esqueceremos depois de 2000 anos
e então tomaremos cerveja
Inventaremos a zumba
Jamais seremos bestas
Mas seremos sempre tontos
Descortinando armamentos bélicos sobre as divergências
E incidiremos com tamanha brutalidade sobre as horas
Que acordaremos um a um todos os peixes do mundo.

Olha meu peixe prata, sou demasiado bruta, mas gostava que tu pudesses não ser acordado nunca.



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