29 janeiro 2016

Meninos Abortados

dá-nos a tua mão inesperada
mãe  

que nós somos um grito ríspido a te inflamar os ouvidos sem querer que nós somos a parte que não cabe e habitamos as praças vazias do teu coração arregaçado e a parte fluxo e a parte podre do teu negro buraco

mas dá-nos
a tua mão mãe

que estamos crus sem querer e te ferimos a língua sem querer e queremos apenas tua mão inesperada que nos chegue quando seus olhos se alongarem até os pássaros
pois que apenas os meninos
abortados
compreendem a importância do acúmulo de gaivotas sobre um domingo violentamente branco  que basta um domingo violentamente branco para sermos violentados e um domingo branco para nos fazer fluxo
contra teu negro buraco

dá-nos mãe
 a tua mão

 que ainda assim quando se for nascer a manhã seremos nós a te pousar no ombro invisíveis a te puxar os cabelos sem querer e te expirar a insanidade das horas e te beijar as sobrancelhas e te chamar a atenção
 para os pássaros

raquíticos e crus a te tampar os negros buracos que habitamos invisivelmente as praças vazias dos teus olhos arregaçados apenas meninos
abortados

que conhecem a clemência e ninguém mais a diz a clemência e ninguém mais a faz a clemência e ninguém mais ama e nem conhece a pureza das mariposas e nem anota que de tuas preces borboletam mariposas
até nós

 e que teu corpo nu é quente por sob a água e que teus delírios são nossas lágrimas as dos meninos
abortados

e seremos nós eternamente a vagar do teu lado por entre tuas pernas e por debaixo de teus sussurros fazendo troça dos demônios insanos e sarcásticos assobiando melodias aquáticas em teus sonhos quebrados
descendo de
teus olhos
até a curva de
 teu braço
para
deitar
 invisíveis
entre teus dedos

 dá-nos mãe
tua mão esperada

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